sábado, 13 de outubro de 2007

Números

01. (zero um) mais um.
02. (zero dois) o chefe.
06. (zero seis) ele mesmo.
E assim começa a histórias dos homens números.

Lugar comum, lugar qualquer, aqui, ali ou em qualquer lugar, tudo é bem rotina. 02 dispara as ordens, quer ser atendido o mais rápido possível, claro. O tempo pra ele é dinheiro e como todos, ele não quer perdê-lo. 01 cuida em atender as ordens, sabe que o emprego, apesar de arriscado, traz bons lucros. Não quer ter a mão decepada por um descuido que pode ser evitado. Ele sabe como executar as ordens, sabe como chegar junto, sabe fazer com que paguem o montante devido na hora e local especificado. 06 é apenas aquele que segura as pontas quando dá, quando não dá, paciência. É o primeiro a entregar os fatos, correr com a carga e fazer a fita. Ele sabe bem que “se vacilar o jacaré abraça" e sabe o quanto dói o abraço do jacaré. Depois de dois tiros de raspão, o que ele mais faz é correr rapidamente pelos becos e vielas.
Longe dali vive um cidadão. Residente no número 224 e que sai todos os dias pro trabalho. Toma o ônibus da linha 1758 sempre às 7:03 da manhã. Chega ao trabalho, entra no elevador e pede: 5° andar. Sala 1, a sala de recepção. Senta na máquina 1 e começa, das 8:00 às 18:00 aquele trabalhinho de merda, que no final do mês rende uns 500 paus, mas e daí? Dignidade é tudo, né?!
02 resolve que as coisas vão mudar por ali, afinal ele quem manda. Chama atenção do 04 porque ele não está sendo eficiente, diz que se mais um vacilo acontecer, quem vai voar é ele. Aqui o culpado nunca é o boss, nunca 02 será culpado por um erro, mesmo que ele que erre. Sabe, a hierarquia aqui é uma coisa impressionante. Sempre foi seguida. Enquanto 03 e 07 vivem de soltar fogos no telhado e ganham em pó para isso e também para os manter acordados, 02 pesa, mede, filtra, empacota, alinha, passa o troco, pega a grana, paga o toco. Com ajuda de um aqui, outro ali, consegue driblar os gambés, os alemão, os porcos fardados e faz uma incrível rede de mercado sujo e inabalável. A não ser quando aqueles com sede de justiça resolvem fazê-la com as próprias mãos, aí já viu, né?! Lá vem merda. Mas fora isso, tudo reina na santa paz de Deus, ou do Diabo, por quê não? Ali ninguém sabe a quem pedir ou agradecer, na verdade. E tanto faz, o destino é só um: 12 na cabeça, mas até lá muitos litros, quilos, tiros...

Às 18:00 o cidadão trabalhador volta pra casa, dessa vez de metrô. Linha verde, 3ª estação depois da subida. Aquele mesmo trajeto há 9 anos. Quando chega em casa, a mulher e as duas filhas o esperam pro jantar. E após a novela das 20:00 todos deitam para mais uma noite de sono e mais uma jornada no dia seguinte. O que na verdade ninguém sabe é até quando 02 continuará no comando, até quando o cidadão ficará imune às balas perdidas e à corrupção que lhe salta aos olhos, e por quanto tempo a pseudo-paz reinará na Vila de Todos os Santos. Como tudo ali é relativo, inclusive as ladeiras, o que se pode prever não passa da previsão do tempo, dada pelos jornais. Certezas só da morte, e essa todos têm. Uns sabem somente como irão morrer, é o caso de 04. Ele sabe que ou de pó ou de bala, muito bem acertada, obrigado. Enquanto isso 02 consegue iludir e ludibriar mais uns 05 para o seu exército. Enquanto isso mais uns 5 policiais são colocados pra fora da corporação com as denúncias de corrupção e irão se candidatar ao posto de soldados do 02. Enquanto isso, mais uns 5 cidadãos da cidade do caos morrem, com pelo menos 2 tiros de 38, por negligência de uns 5 soldados, de qualquer um dos lados.

E o saldo? 5, 10, quantos mil? 02 não quer saber, o que importa é o barato fazer efeito, o devedor pagar direito, o gambé dá o seu jeito pra que tudo saia perfeito. Caiu mais um com um tiro no peito.